Amar é normal. Anormal é não amar
Usei, propositadamente, as palavras normal e anormal no título. Porque sempre achámos normal chamar anormal a alguém que é, apenas, diferente. Durante muito tempo o outro seria atrasado. Um anormal, deficiente, um mongo. Ou monga. Porque eram, dizia-se, mongolóides. Até me dói escrever isto mas era a verdade…
As pessoas com deficiência mental, especialmente Trissomia 21, foram, durante muito tempo, socialmente ostracizadas, maltratadas e, mesmo, desprezadas. Creio que estamos, hoje, mais informados, despertos para a importância de aceitar a diferença, capazes de compreender que isso de ser um mongo tem muito pouco a ver com a anomalia que provoca a deficiência mental e muito mais com a incapacidade que algumas pessoas (ainda) têm de ver para além do seu pequeno umbigo.
A APPACDM teve uma iniciativa maravilhosa: juntou vários jovens com algum tipo de deficiência mental e mostrou-lhes que são tão ou mais bonitos do que as outras pessoas. Essas outras para as quais também estes jovens olham de forma diferente por se sentirem, eles, diferentes.
Não somos todos diferentes uns dos outros?
Somos.
Eu sei. As características físicas e, por regra, o desenvolvimento mental e intelectual torna-as diferentes do que se definiu como socialmente normal mas, sinceramente, acho-as muito especiais e muito pouco anormais. Foi o que o projecto do livro Um dia igual aos outros provou a cada um deles porque, em boa verdade, com maquilhagem e roupas bem escolhidas, ficamos TODOS sempre muito diferentes daquilo que o espelho mostra no dia-a-dia.
São muitas as pessoas que não se amam. Odeiam-se, e a cada milímetro do seu corpo, numa atitude que corrói a alma e destrói a sua relação com os outros. Não é fácil ser diferente num mundo que apela à uniformidade e que estabeleceu padrões de beleza quase inalcançáveis para o comum dos mortais: aqueles que acordam todos os dias bem cedo, enfrentam o trânsito e os transportes públicos, querem alimentar-se bem sem saberem como, cedem à tentação ou se deixam enganar por rótulos carregados de ilusões, chegando ao final do dia sem tempo, paciência, capacidade física e mental ou, simplesmente, dinheiro no bolso para cuidarem de si. A vida – a vida normal – é assim e só nós podemos mudar isso. Mas (ainda) não podemos, sozinhos, mudar a forma como o outro olha para nós e nos avalia, com impacto na ideia que fazemos de nós próprios. Estes jovens sentem, amam, aprendem como qualquer um de nós. Podem divertir-se, trabalhar e viver de forma autónoma se os incentivarmos. Porque amor é amar e também as pessoas com algum traço físico (ou mental) que as diferencie dos outros merecem sentir-se bem na sua pele não apenas por um dia, para um sessão de fotografias…
Afinal sou bonita, expressão de uma das modelos, foi a que mais me cativou porque as noções de feio e bonito estão de tal forma sugestionadas que perdemos a ideia de respeito e aceitação pelas diferenças que nos unem. Também eu olho ao espelho e, por vezes, me julgo, critico e trato mal. Quem nunca?… O segredo para nos sentirmos bem (ou, pelo menos, melhor) é aprendermos a aceitar que todos temos um #BadHairDay e olhar sempre para os nossos aspectos positivos. Porque todos, à nossa maneira, somos bonitos. Este projeto fotográfico deu a oportunidade de fazer estas pessoas sentirem-se bonitas. Muitas afirmaram que antes deste livro se sentiam feias. A maquilhagem, o cabelo e o trabalho final da fotografia fez com que muitos chorassem perante o resultado final e fê-los perceber que, afinal, são bonitos.
Além da imagem que mudaram de si próprios, fizeram amigos e provaram, a cada um de nós, que a beleza vem sempre de dentro e que somos nós que a moldamos do lado de fora. Com ou sem #makeup…
Jornalista: Paula Cordeiro
Fonte: Urbanista